Para aqueles que apontam que sou um crítico incessante e apenas posto reclamações, permitam-me discordar… de tempos em tempos, compartilho um trabalho meu, como podem conferir clicando aqui.
Entretanto, a crítica é algo que não consigo evitar. Vamos lá, com um pouco de contexto… Em 2010, eu era sócio de Marcio Nunes na Bitix, uma empresa de tecnologia focada no desenvolvimento de aplicativos para smartphones. Minha função era estabelecer parcerias com agências de publicidade e oferecer nossa expertise na área. Tentamos argumentar que, “no futuro”, as pessoas acessariam mais a internet por meio de smartphones do que por computadores. Surpreendentemente, os criativos, profissionais de mídia e planejamento não acreditaram. Em 2010. Insistimos que as campanhas precisariam de um complemento: um aplicativo integrado às ações de comunicação para serem completas. Sem sucesso. Eles simplesmente não conseguiam visualizar. Meu projeto fracassou.
Muitos anos antes, na abertura da internet pública no Brasil, eu e meus sócios Thomas Wilson e Robson Ribeiro fundamos um dos primeiros provedores de internet privada do país, utilizando a infraestrutura da Embratel. Rapidamente, desenvolvemos websites para nossos negócios, mas as agências também foram resistentes, levando um bom tempo para entender o que era a internet. Houve até um episódio em que uma agência reclamou porque a produtora utilizou a internet. Era um cliente em São Paulo, e eu criei um hotsite, secretamente, para apresentar o trabalho que estávamos desenvolvendo juntos. A agência ficou furiosa, pois não sabia como usar, não tinha acesso à internet.
Lembro-me do primeiro microcomputador ao qual tive acesso, um modesto TK82C com apenas 4K de memória. Fiquei desapontado ao descobrir que a máquina não sabia nada e que eu precisava digitar dezenas de linhas de código para fazê-la funcionar. Para alguém que viu “2001: Uma Odisseia no Espaço” e conheceu o HAL 9000 (Heuristically Programmed Algorithmic Computer), foi uma grande decepção.
As coisas demoraram a melhorar, pois a promessa do “sabe tudo” não foi cumprida. A primeira tentativa nesse sentido foram as enciclopédias em CD-ROM, onde, em 640MB, toda a informação do mundo deveria caber. Por exemplo, a Microsoft Encarta. Os computadores, que não estavam interconectados, não sabiam nada. No máximo, tinham acesso aos 640MB do CD-ROM.
Então veio a internet, os computadores começaram a se conectar, mas no início faltavam servidores, informações digitalizadas e uma comunicação ágil entre eles, agora terminais, as fontes de informações, que são os servidores. No início, nos conectávamos com modems analógicos de baixa velocidade.
Foram necessários mais 20 anos até que as redes de intercomunicação entre os computadores ficassem suficientemente rápidas para que o tempo de resposta fosse aceitável. Vocês sabiam que todo o processamento da Siri, por exemplo, não é feito no iPhone ou Mac? Sua voz é transmitida para um servidor da Apple na Carolina do Norte, onde é decodificada, a Siri encontra a resposta e a envia de volta. Tudo isso em um tempo mínimo. Isso é a latência aceitável. Vejam a importância da latência… Para cada 100 ms de latência, o Google estimou uma queda de aproximadamente 0,20% no tráfego de pesquisa, e a Akamai mostrou uma queda de 7% nas taxas de conversão. No Walmart.com e Staples.com, cada 1 segundo de melhoria no tempo de carregamento equivale a um aumento de 2% e 10% nas taxas de conversão, respectivamente. Não é à toa que minimizar a latência na internet é uma indústria multibilionária.
Estamos agora em 2024, onde temos uma comunicação rápida o suficiente e servidores com informações suficientes para finalmente, após 50 anos da invenção do Altair e 56 anos da estreia de “2001: Uma Odisseia no Espaço”, termos um computador que finalmente cumpre sua promessa de ajudar a humanidade, permitindo uma interação natural, sem exigir conhecimentos avançados de computação.
Para mim, IA é simplesmente isso: a realização da promessa da computação. Aquilo que o computador deveria ter sido desde o início, mas não conseguiu por limitações técnicas. É muito, mas para mim, é só isso.
Com todo esse histórico, olho com desconfiança para os supostos especialistas em IA, os “domadores” de IA, os mestres dos prompts de IA. Na boa, são os mesmos que não entenderam a internet nos anos 90, os mesmos que não entenderam os smartphones em 2010. Pessoas que mal sabem usar um iPhone e chamam qualquer calculadora que some 1 + 1 de IA. Sou pretensioso? Sou.
Minha experiência me mostrou que as agências frequentemente se apresentam como tecnológicas e inovadoras, mas, na realidade, são compostas em sua maioria por pessoas que mal sabem configurar um iPhone e que precisam de ajuda técnica até para ligar uma impressora na tomada. Agora, querem se tornar especialistas em IA.
Para mim, toda a computação daqui para frente será baseada naquilo que estão chamando de IA. Absolutamente tudo o que faremos em um computador terá a participação dele e da chamada IA. Meu programa de email, Spark, oferece IA para escrever emails. O navegador oferece IA para pesquisas mais precisas. O Photoshop oferece IA para retoques mais simples. O iFood usa IA para otimizar os pedidos. Tudo. Acho toda essa empolgação com IA uma bobagem. Vai desaparecer em breve. A IA já está incorporada em tudo, e o trabalho continuará o mesmo, com a assistência do computador. Com ou sem a assistência do computador (IA), quem é incompetente continuará incompetente.
Conversando com minha orientadora de mestrado, lembrei-me de quando comecei na arte. Para fazer um degradê, eu precisava usar um aerógrafo, tomar cuidado com os respingos, preparar as cores com Ecoline e aerografar habilmente em uma folha de papel schoeller. Usar máscaras, Letraset, e todo o resto. Com o advento dos computadores, tornou-se uma questão de segundos e dois cliques. Mas então descobri que o trabalho mais importante não é fazer o degradê, mas sim criar mentalmente a imagem para sua posterior execução.
Me digam… como seria o prompt de IA de alguém que não tem nada na cabeça? Que não sabe imaginar, pensar, escolher? Dito isso, chegamos à conclusão de que os fundamentos do trabalho continuam os mesmos, apenas os computadores, aproveitando a disponibilidade de dados e a interconexão de baixa latência, são capazes de fazer o que sempre deveriam ter feito, mas não conseguiam.
Lembram-se dos carros que tinham uma placa atrás dizendo “Automático”? Pois é, nenhum carro de luxo tem mais essas placas, pois já se sabe que todos são automáticos. Toda essa conversa sobre IA em tudo logo chegará ao fim, porque tudo será IA. Tudo já é IA.
A esperança é que a humanidade utilize essa nova ferramenta para elevar o nível de seus trabalhos, pensamentos e eficiência. Uma esperança um tanto frágil, já que estamos vendo a maioria usar todos esses avanços para assistir vídeos e fazer dancinhas no TikTok, com IA.
Amém.
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